Processo n.º 1146/19.7T8PTM.E1
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Sumário:
Não é admissível decretar, em sentença que
julgue procedente uma acção de despejo, o
diferimento da desocupação do locado, com intervenção do Fundo de Socorro Social
para assegurar o pagamento das rendas vencidas ao longo do prazo daquele.
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Na presente acção de despejo,
proposta por CA Arrendamento Habitacional – Fundo de Investimento Imobiliário Fechado
para Arrendamento Habitacional, gerido, administrado e legalmente representado
por Square Asset Management – Sociedade Gestora de Fundos de Investimento Imobiliário,
S.A., contra Afonso e Henrique, foi proferida sentença cujo dispositivo é, na
parte que interessa, o seguinte: “Pelo exposto e tudo ponderado, o Tribunal
decide: a) Julgar a acção procedente, por provada e, em consequência, declarar
resolvido o contrato de arrendamento indicado em 2 da petição inicial, nos
termos do art.º 1083º nº 3 do C.C. b) Condenar o 1º Réu na entrega do locado
referido em 1 da petição inicial, no prazo de 90 dias após o trânsito em
julgado da presente sentença, nos termos do art.º1087º do C.C., sendo que, as
rendas relativas a tal prazo de diferimento serão asseguradas pelo Fundo de
Socorro Social do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, nos
termos do art.º15ºN nº3 do N.R.A.U. c) Condenar ambos os Réus, solidariamente,
no pagamento à Autora, das rendas vencidas e não pagas, no valor de 3.519,87 €
(três mil quinhentos e dezanove euros e oitenta e sete cêntimos) e vincendas
até efectiva entrega do locado, bem como, dos respectivos juros de mora à taxa
legal cível, sem prejuízo do disposto em b); d) Condenar ambos os Réus,
solidariamente, no pagamento à Autora de uma indemnização, nos termos do
art.º1045º nº2 do C.C., em caso de mora na entrega do imóvel arrendado, após o
decurso do prazo referido em b); (…) Registe e notifique, incluindo ao Fundo de
Socorro Social do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, nos
termos do art.º15ºO nº3 do N.R.A.U. e ainda à S.S. e Câmara Municipal de
Portimão.”
O
Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, I.P., interpôs recurso de apelação da
sentença, tendo formulado as seguintes conclusões:
1. Vem
o presente recurso interposto da douta decisão a fls., na parte que decretou o
diferimento de desocupação, pelo prazo de noventa dias, contados a partir do
trânsito em julgado da referida sentença e condenou o Fundo de Socorro Social
(F.S.S) a assegurar as rendas vencidas no prazo de diferimento concedido.
2.
Salvo o devido respeito, não pode o ora recorrente conformar-se com tal
decisão, pelos fundamentos a seguir referenciados.
3. O
diferimento de desocupação decretado nos termos referidos e a condenação do FSS
a assegurar as rendas vencidas em tal período, em sede de acção declarativa,
parece-nos, salvo melhor entendimento, que carece de substrato legal.
4.
Isto porque, nos termos dos dispositivos legais vigentes e aplicáveis ao
diferimento de desocupação do locado para habitação (arts.º 864.º e 865.º do
C.P.C e arts. 15.º - N e 15.º - O da Lei 6/2006 de 27 Fevereiro), resulta que o
mesmo deverá ser requerido pelo executado/arrendatário, em prazo definido, em
sede de processo executivo, no prazo de oposição à execução (art.º 864.º C.P.C)
ou dentro do prazo para a oposição ao procedimento especial de despejo, (art.º
15.º - N da Lei n.º 6/2006), e decretado nos termos estatuídos nos referidos
artigos em sede dos processos referenciados.
5. A
intervenção do Fundo de Socorro Social nesta sede, apenas, é prevista em normas
especiais, concretamente, no art.º 864.º n.º 3 do C.P.C e no art.º 15.º - N,
n.º 3 da Lei 6/2006 de 27 de Fevereiro, não existindo qualquer norma que
determine a sua intervenção em sede de acção declarativa como a dos presentes
autos.
6.
Salvo o devido respeito e melhor entendimento, não nos parece que exista uma
lacuna na lei, na medida que não existe nenhum vazio normativo ou uma situação omissiva
derivada de uma falha de regulação, mas antes que se trata de uma opção do
legislador, que entendeu prever a figura do diferimento de desocupação do
locado apenas em sede de acção executiva ou do procedimento especial de
despejo.
7.
Cumpre ainda referir, que haverá analogia legis
sempre que, perante um caso concreto a decidir, que se confronte no plano
regulatório com uma lacuna, o que in casu,
parece-nos não existir, ou seja, com um vazio normativo ou uma situação
omissiva derivada de uma falha de regulação, esta última é preenchida ou
integrada através de uma norma existente que disponha sobre casos análogos.
8.
Dispõe o artigo 10.º do Código Civil sobre a integração de lacunas através do
recurso à analogia legis. A norma do
n.º 1 do preceito prevê o recurso à analogia ao dispor que: “Os casos que a lei não preveja são
regulados segundo a norma aplicável aos casos análogos”.
9. Por
seu turno, o nº 2 define analogia: “Há
analogia sempre que no caso omisso procedam as razões justificativas da
regulamentação do caso previsto na lei”.
10.
Acresce que, conforme já foi referido, a intervenção do Fundo de Socorro Social
nesta sede, apenas, é prevista por normas excepcionais, concretamente, no art.º
864.º n.º 3 do C.P.C e no art.º 15.º - N, n.º 3 da Lei 6/2006 de 27 de Fevereiro,
pelo que face, ao disposto no artigo 11º do Código Civil, são vedadas operações
analógicas a partir de normas excepcionais.
11. Em
sede do RAU o artigo 102.º (Diferimento), previa o seguinte: “ 1 - A desocupação de um local arrendado
para habitação, motivada pela cessação do respectivo contrato, pode ser
diferida por razões sociais imperiosas nos termos dos artigos seguintes. 2 – O
diferimento é facultado na decisão da acção de despejo que conduza à
desocupação.”
Sucede
que,
12. A
matéria referente ao diferimento da desocupação foi migrada para o Código de
Processo Civil revogado, por via das alterações introduzidas pela Lei 6/2006 de
27 de Fevereiro e passou a estar regulada em sede do processo executivo,
concretamente, nos artigos 930.º B a 930.º do citado diploma.
13.
Com as alterações introduzidas pela Lei 31/2012 de 14 de Agosto à Lei 6/2006 de
27 de Fevereiro é criado o procedimento especial de despejo e igualmente
introduzido o art.º 15.º - N (Diferimento da desocupação de imóvel arrendado
para habitação), nos termos do qual se estatuiu que o arrendatário pode
requerer o diferimento de desocupação dentro do prazo para a oposição ao
procedimento referido.
14. No
C.P.C actual a figura do diferimento de desocupação, regulada nos arts.º 864.º
e 865.º, continua prevista em sede da fase executiva.
15.
Nos termos expostos e salvo melhor entendimento, não resulta da lei actualmente
vigente que o diferimento nos termos decretados possa ser facultado em sede de
fase declarativa e parece-nos carecer de base legal a condenação do F.S.S no
pagamento das rendas vencidas no período do dito diferimento.
Nestes
termos e demais de direito, deve ser dado provimento ao presente recurso,
revogando-se a decisão ora recorrida, na parte que decretou o diferimento de
desocupação por aplicação analógica do regime do art.º 15.º - N e O do NRAU,
bem como, a condenação do FSS no pagamento das rendas vencidas nos noventa dias
após o trânsito em julgado da referida sentença.
Não foram apresentadas
contra-alegações.
O recurso foi admitido, com
subida nos próprios autos e efeito meramente devolutivo.
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Questão a resolver: saber se existe
fundamento para o decretamento do diferimento da desocupação do locado pelo recorrido
Afonso e
para a condenação do recorrente, através do Fundo de Socorro Social, a
assegurar o pagamento das rendas que se vencerem durante o prazo de diferimento
concedido.
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Nenhum dos réus contestou, pelo que, nos
termos do artigo 567.º, n.º 1, do CPC, o tribunal a quo julgou provados todos os factos alegados pela autora.
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O recorrente sustenta que não existe
fundamento para o decretamento do diferimento da desocupação do locado pelo recorrido
Afonso e
para a sua própria condenação a assegurar o pagamento das rendas vencidas no
prazo de diferimento concedido, invocando, sucintamente, os seguintes
argumentos:
1 – A lei não prevê o diferimento da
desocupação do locado destinado a habitação, com intervenção do Fundo de
Socorro Social para assegurar o pagamento das rendas que se vencerem ao longo
desse período, na acção de despejo, apenas o fazendo em sede de acção executiva
instaurada com vista à entrega do locado (artigos 864.º e 865.º do CPC) e do
procedimento especial de despejo (artigos 15.º-N e 15.º-O do NRAU);
2 – Nas hipóteses em que a lei permite
tal diferimento, o mesmo terá de ser requerido pelo arrendatário, dentro de
determinado prazo; tal prazo é, consoante os casos, o da oposição à execução
(artigo 864.º do CPC) ou o da oposição ao procedimento especial de despejo
(artigo 15.º-N do NRAU);
3 – A ausência de previsão do mecanismo
descrito em 1 na acção de despejo não constitui uma lacuna, antes se tendo
tratado de uma opção do legislador;
4 – As normas que estabelecem o
mecanismo descrito em 1 têm natureza excepcional, pelo que, atento o disposto
no artigo 11.º do Código Civil, sempre estaria vedada a sua aplicação por
analogia.
Desde já se adianta que todos estes
argumentos procedem.
O artigo 14.º, n.º 1, do NRAU,
estabelece que a acção de despejo se
destina a fazer cessar a situação jurídica do arrendamento sempre que a lei
imponha o recurso à via judicial para promover tal cessação e segue a forma de
processo comum declarativo. A lei não prevê, em tal sede, a possibilidade de o
tribunal decretar o
diferimento da desocupação do locado, com intervenção do Fundo de Socorro
Social para assegurar o pagamento das rendas que se vencerem ao longo desse
período. Tal possibilidade apenas se encontra prevista na acção executiva
destinada à entrega do locado que eventualmente venha a ser instaurada, nos
termos dos artigos 859.º a 867.º do CPC, bem como no procedimento especial de
despejo, regulado nos artigos 15.º a 15.º-S do NRAU.
Pormenorizando, o artigo 862.º do CPC
estabelece que à execução para entrega de coisa imóvel arrendada são aplicáveis
as disposições referentes à execução para entrega de coisa certa, com as
alterações constantes dos artigos 863.º a 866.º. O artigo 863.º, n.º 1,
estabelece que a execução se suspende se o executado requerer o diferimento da
desocupação do local arrendado para habitação, motivada pela cessação do
respectivo contrato, nos termos do artigo seguinte. O artigo 864.º, n.º 1,
estabelece que, no caso de imóvel
arrendado para habitação, dentro do prazo de oposição à execução, o executado
pode requerer o diferimento da desocupação, por razões sociais imperiosas,
devendo logo oferecer as provas disponíveis e indicar as testemunhas a
apresentar, até ao limite de três. O artigo 864.º, n.º 2, estabelece que o
diferimento de desocupação do locado para habitação é decidido de acordo com o
prudente arbítrio do tribunal, devendo o juiz ter em consideração as exigências
da boa-fé, a circunstância de o arrendatário não dispor imediatamente de outra
habitação, o número de pessoas que habitam com o arrendatário, a sua idade, o
seu estado de saúde e, em geral, a situação económica e social das pessoas
envolvidas, só podendo ser concedido desde que se verifique algum dos seguintes
fundamentos: a) Que, tratando-se de resolução por não pagamento de rendas, a
falta do mesmo se deve a carência de meios do arrendatário, o que se presume
relativamente ao beneficiário de subsídio de desemprego, de valor igual ou
inferior à retribuição mínima mensal garantida, ou de rendimento social de
inserção; b) Que o arrendatário é portador de deficiência com grau comprovado
de incapacidade superior a 60 %. O artigo 864.º, n.º 3, estabelece que, no caso
de diferimento decidido com base na alínea a) do número anterior, cabe ao Fundo
de Socorro Social do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social pagar
ao senhorio as rendas correspondentes ao período de diferimento, ficando aquele
sub-rogado nos direitos deste. O artigo 865.º, n.º 1, dispõe que a petição de
diferimento da desocupação assume caráter de urgência e é indeferida
liminarmente quando: a) Tiver sido deduzida fora do prazo; b) O fundamento não
se ajustar a algum dos referidos no artigo anterior; c) For manifestamente
improcedente. Os n.ºs 2 a 4 do artigo 865.º dispõem que, se a petição for
recebida, o exequente é notificado para contestar, dentro do prazo de 10 dias,
devendo logo oferecer as provas disponíveis e indicar as testemunhas a
apresentar, até ao limite de três (n.º 2), que o juiz deve decidir do pedido de
diferimento da desocupação por razões sociais no prazo máximo de 20 dias a
contar da sua apresentação, sendo, no caso previsto na alínea a) do n.º 2 do
artigo anterior, a decisão oficiosamente comunicada, com a sua fundamentação,
ao Fundo de Socorro Social do Instituto de Gestão Financeira da Segurança
Social (n.º 3) e que o diferimento não pode exceder o prazo de cinco meses a
contar da data do trânsito em julgado da decisão que o conceder (n.º 4). Destas
normas decorre, nomeadamente, que, na acção
executiva destinada à entrega do locado, a apresentação, pelo executado, de
requerimento de diferimento da desocupação, dentro do prazo e com observância
dos requisitos formais descritos, tem efeito suspensivo daquela, iniciando-se
então o incidente regulado nos artigos 864.º e 865.º do CPC.
Por outro lado, o artigo 15.º, n.º 1, do
NRAU, define o procedimento especial de despejo como o meio processual que se destina a efectivar
a cessação do arrendamento, independentemente do fim a que este se destina,
quando o arrendatário não desocupe o locado na data prevista na lei ou na data
fixada por convenção entre as partes. O artigo 15.º-N do NRAU estabelece que,
no caso de imóvel arrendado para habitação, dentro do prazo para a oposição ao
procedimento especial de despejo, o arrendatário pode requerer ao juiz do
tribunal judicial da situação do locado o diferimento da desocupação, por
razões sociais imperiosas, devendo logo oferecer as provas disponíveis e
indicar as testemunhas a apresentar, até ao limite de três (n.º 1); o
diferimento da desocupação do locado para habitação é decidido de acordo com o
prudente arbítrio do tribunal, devendo o juiz ter em consideração as exigências
da boa-fé, a circunstância de o arrendatário não dispor imediatamente de outra
habitação, o número de pessoas que habitam com o arrendatário, a sua idade, o
seu estado de saúde e, em geral, a situação económica e social das pessoas
envolvidas, só podendo ser concedido desde que se verifique algum dos seguintes
fundamentos: a) que, tratando-se de resolução por não pagamento de rendas, a
falta do mesmo se deve a carência de meios do arrendatário, o que se presume
relativamente ao beneficiário de subsídio de desemprego, de valor igual ou
inferior à retribuição mínima mensal garantida, ou de rendimento social de
inserção; b) que o arrendatário tem deficiência com grau comprovado de
incapacidade igual ou superior a 60% (n.º 2); no caso de diferimento decidido
com base na alínea a) do número anterior, cabe ao Fundo de Socorro Social do
Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social pagar ao senhorio as rendas
correspondentes ao período de diferimento, ficando aquele sub-rogado nos
direitos deste (n.º 3). O artigo 15.º-O do NRAU estabelece, por seu turno, que
o requerimento de diferimento da desocupação assume carácter de urgência e é
indeferido liminarmente quando: a) tiver sido apresentado fora do prazo; b) o
fundamento não se ajustar a algum dos referidos no artigo anterior; c) for
manifestamente improcedente (n.º 1); se o requerimento for recebido, o senhorio
é notificado para contestar, dentro do prazo de 10 dias, devendo logo oferecer
as provas disponíveis e indicar as testemunhas a apresentar, até ao limite de
três (n.º 2); o juiz deve decidir o pedido de diferimento da desocupação por
razões sociais no prazo máximo de 20 dias a contar da sua apresentação, sendo,
no caso previsto na alínea a) do n.º 2 do artigo anterior, a decisão
oficiosamente comunicada, com a sua fundamentação, ao Fundo de Socorro Social
do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social (n.º 3); o diferimento
não pode exceder o prazo de cinco meses a contar da data do trânsito em julgado
da decisão que o conceder (n.º 4). Todas estas normas são privativas do
procedimento especial de despejo, que não se confunde com a acção de despejo, a
que se reporta o artigo 14.º do NRAU. Repetimos, a lei não prevê a
possibilidade de, na acção de despejo, o tribunal decretar o diferimento da desocupação do locado,
com intervenção do Fundo de Socorro Social para assegurar o pagamento das
rendas que se vencerem ao longo desse período.
A ausência dessa previsão não constitui
uma lacuna da lei. Estabelecendo esta, nos termos descritos, a possibilidade de
diferimento da desocupação do local arrendado para habitação na acção
executiva, seria redundante fazê-lo, igualmente, em sede declarativa, ou seja,
na acção de despejo. Tal duplicação seria desnecessária e geradora de problemas
ao nível da interpretação da lei. Para acautelar o interesse da pessoa obrigada
à desocupação do locado, basta a permissão legal do diferimento daquela na
acção executiva. Como o recorrente acertadamente observa, tratou-se de uma
opção do legislador, inexistindo uma lacuna na regulamentação da acção de
despejo que careça de ser preenchida através da aplicação analógica de normas
legais estabelecidas em sede diversa.
Ainda que estivéssemos perante uma
lacuna, a mesma não poderia ser preenchida mediante a aplicação, por analogia,
das normas que estabelecem a possibilidade de diferimento da desocupação, com
intervenção do Fundo de Socorro Social para assegurar o pagamento das rendas
vencidas ao longo desse período, que acima citámos. Tais normas impõem uma
restrição ao direito de propriedade que tem de ser considerada excepcional,
pois, apesar de estar reconhecido o direito à restituição do locado, o
exercício de tal direito fica temporariamente paralisado por razões atinentes à
pessoa do obrigado à restituição. Consequentemente, nos termos do artigo 11.º
do Código Civil, sempre estaria vedada a aplicação das normas referidas por
analogia.
Aos argumentos invocados pelo
recorrente, acrescentamos um outro: ainda que fosse processualmente admissível
o decretamento do diferimento da desocupação do locado na acção de despejo, com
a consequente intervenção do Fundo de Socorro Social para assegurar o pagamento
das rendas que se vencessem ao longo desse período, a sentença recorrida não contém
factos que sustentem tal medida. Dada a falta de contestação, foram julgados
provados, nos termos do artigo 567.º, n.º 1, do CPC, todos os factos alegados
pela autora. Porém, apenas esses. Não foram julgados provados factos que
justificassem o diferimento da desocupação. Tendo em vista essa justificação, o
tribunal a quo, na fundamentação de
direito, invoca factos não provados, a saber, “os rendimentos parcos do 1.º Réu (vive com o RSI e outra quantia muito
reduzida, está desempregado e não tem outra habitação)”. Mais, nem aí se
especifica o montante dos rendimentos do referido réu, como sempre se imporia
na descrição de factos relevantes para a decisão da causa, em vez do recurso a fórmulas
de cariz conclusivo.
Decorre do exposto que o recurso deverá
ser julgado procedente, revogando-se o segmento da sentença recorrida que dele constitui
objecto.
As custas do recurso são da
responsabilidade do recorrido Afonso, pois foi ele o beneficiário do diferimento da desocupação que,
por efeito da procedência do recurso, deixa de ser concedido (CPC, artigo 527.º,
n.ºs 1 e 2). Isto, naturalmente, sem prejuízo do decidido em matéria de apoio
judiciário.
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Dispositivo:
Delibera-se, pelo
exposto, julgar o recurso procedente, revogando-se a sentença recorrida no
segmento em que diferiu a desocupação do locado pelo prazo de 90 dias após o
trânsito em julgado e condenou o recorrente a, através do Fundo de Socorro Social, assegurar o
pagamento das rendas relativas àquele período.
Custas a cargo do recorrido Afonso, sem prejuízo do
decidido em matéria de apoio judiciário.
Notifique.
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Évora, 07.04.2022
Vítor
Sequinho dos Santos (relator)
(1.º
adjunto)
(2.ª adjunta)