domingo, 6 de março de 2022

Acórdão da Relação de Évora de 24.02.2022

Processo n.º 2213/20.0T8STB-A.E1

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Sumário:

A negociação, ainda que sem sucesso, entre credor e devedor, de um projecto que envolva a extinção de um crédito, implica o reconhecimento deste para o efeito de interromper a prescrição nos termos do artigo 325.º, n.º 1, do Código Civil.  

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AAA e BBB deduziram oposição, mediante embargos, à execução que lhes é movida por Caixa Geral de Depósitos, S.A., invocando a prescrição do crédito exequendo.

A embargada contestou. Em síntese, sustentou que: 1) O prazo de prescrição do crédito exequendo é o ordinário, de 20 anos, nos termos do artigo 309.º do Código Civil (CC), e não o de 5 anos, estabelecido no artigo 310.º, al. e), do mesmo código, como os embargantes pretendem; 2) Ainda que o prazo fosse de 5 anos, a prescrição não se teria verificado porquanto se verificou o reconhecimento da dívida, por parte dos embargantes, em Março de 2015 e Setembro de 2016, o que constitui causa interruptiva daquela, nos termos do artigo 325.º CC.

Na audiência prévia, os embargantes impugnaram todos os factos alegados na contestação sobre o reconhecimento do direito alegado pela embargada. Foi, então, proferido despacho saneador e procedeu-se à identificação do objecto do litígio e ao enunciado dos temas de prova.

Realizou-se a audiência final, na sequência da qual foi proferida sentença julgando os embargos procedentes e, em consequência, determinando a extinção da execução relativamente aos embargantes.

A embargada interpôs recurso de apelação da sentença, tendo formulado as seguintes conclusões:

1) A Caixa, ora recorrente, considerou o empréstimo totalmente vencido com a venda judicial de ½ do bem imóvel garantia ocorrida na execução fiscal em 21/11/2012, o que, de resto, não mereceu oposição dos ali executados ou aqui recorrente.

2) Em Março de 2015, a recorrente foi contactada pelo procurador dos executados no sentido de saber o estado da dívida, tendo inclusive, a fiadora ora recorrida apresentado uma proposta no sentido de a recorrente financiar a aquisição do imóvel garantia e a consequente liquidação integral da dívida em causa, pelo valor de € 85.000,00, através da gerente do balcão da CGD na Madeira, em Setembro de 2016.

3) Sempre se dirá que a tentativa de negociação da dívida com a exequente, ora recorrente, traduziu-se no reconhecimento tácito da sua qualidade de devedores e da situação de incumprimento definitivo do empréstimo.

4) Conforme consta do doc. 1, junto com a contestação, o procurador dos executados enviou email à ora recorrente, com conhecimento da fiadora ora recorrida, a solicitar que fossem prestadas “todas as informações quanto ao andamento do processo relativamente ao imóvel” garantia “– empréstimo nº 0745/013899/885/0019 – operação nº PT 0035 0774 017995 7 85.”, dizendo ainda que “Ficou agendada uma última reunião para o dia 23 de Dezembro, onde me seria transmitida informação relevante entretanto fornecida pelo Tribunal e, conforme o acordado, seria ainda apreciada a viabilidade de uma possível proposta de aquisição do imóvel em hasta pública.”

5) Tendo a metade do bem imóvel sido vendida em execução fiscal em 2012, os ora recorridos ao pretenderem informações e agendar reuniões, tinha inequivocamente a intenção de alcançar, por acordo, uma solução para a situação de incumprimento em que se encontravam, e torna-se claro ao dizer ainda no email “sendo que os fiadores a parte tendencialmente mais prejudicada no desfecho do processo, sentem-se igualmente apreensivos e agastados com a presente situação.”

6) A fiadora, ora recorrida, em Janeiro de 2017, remete mail à funcionária da CGD, ora recorrente, a questionar se já havia “alguma novidade sobre o assunto em título”, sendo que o assunto em título era exactamente o número do empréstimo que se encontrava em incumprimento (cfr. doc 4, junto com a contestação).

7) Para bom entendedor meia palavra basta, e salvo o devido respeito, está patente o reconhecimento da dívida e a intenção de encontrar uma solução.

8) A esse propósito se refere a testemunha TTT, responsável pelo contencioso de Setúbal de 2015 a 2018, da ora recorrente, afirma no seu depoimento:

Minuto 2.20

“Em 2016 houveram tentativas de solucionar o incumprimento por parte dos fiadores”

Minuto 4.06

“Apresentaram-se na Madeira para obter financiamento para liquidar a dívida que afiançaram” “Caiu por terra a possibilidade de liquidar a parte da fiança porque o esforço era muito grande face aos rendimentos que tinham”

9) Dúvidas não restam que o interesse na proposta de aquisição pelos fiadores com financiamento da credora, seria uma solução para o crédito que tinham afiançado e que se encontra em situação de incumprimento.

10) Com o devido respeito, parece ilógico considerarem-se provados os contactos e a apresentação de uma proposta de aquisição do imóvel para, logo de seguida, se considerar que não houve proposta.

11) Deve, pois, alterar-se o nº 3 da matéria de facto provada, que passará a ter o seguinte teor, o que se requer:

3) Entre 2015 e 2016 foram iniciadas conversações dos Executados com a Exequente no sentido de saber se seria possível obter um financiamento para a aquisição do imóvel sobre o qual incide a hipoteca, de forma a solucionar o montante do qual eram devedores.

12) Com a devida alteração à matéria de facto, entende a ora recorrente não assistir qualquer razão ao embargante quando invoca a prescrição da dívida.

13) Dispõe o nº 1 do artigo 323º do Código Civil que a citação ou notificação judicial de qualquer acto que exprima a intenção de exercer o direito interrompe a prescrição.

14) Conforme estabelecido no nº 2 deste mesmo preceito, a prescrição tem-se por interrompida logo que decorram os cinco dias após ter sido requerida a realização da citação e a mesma não for efectuada por causa não imputável ao requerente.

15) Ao recorrer ao Tribunal, a ora recorrente requereu na sua petição inicial que os executados fossem citados para exercerem o seu direito de defesa. De qualquer modo,

16) Houve reconhecimento do direito quando os recorridos, através das tentativas de negociação manifestaram interesse em procurar resolver a situação da dívida junta da CGD.

17) Esta conduta interrompeu o decurso do prazo de prescrição, nos termos do disposto no artigo 325º do Código Civil, traduzindo-se estas negociações inequivocamente no reconhecimento do direito de crédito da recorrente e da sua condição de devedor.

18) Caso assim não se entenda, sempre se dirá que o embargante ao invocar a prescrição da dívida, socorrendo-se (erradamente) do postulado na alínea e) do art. 310.º do Código Civil, carece de razão.

19) Tal normativo não poderá, nesta sede, ser aplicável, porquanto a obrigação exequenda não é subsumível à alínea e) do artigo 310.º do Código Civil mas sim ao artigo 309.º do mesmo diploma.

20) Conforme resulta do requerimento executivo inicial, nos termos do contrato de mútuo e respetivo documento complementar, a recorrente considerou integralmente vencida a dívida, face à venda judicial de metade da garantia hipotecária, pelo que inexiste qualquer dúvida de que está em causa o vencimento antecipado da obrigação liquidável em prestações pela perda do benefício do prazo.

21) O prazo no mútuo oneroso destina-se apenas a proteger o mutuário no sentido de impedir o credor de cobrar a totalidade da dívida enquanto o plano estiver sendo cumprido.

22) Não o sendo, assiste ao credor o direito de resolver o contrato, tornando imediatamente exigíveis as prestações vencidas e não pagas, bem como o capital vincendo.

23) A obrigação de pagamento do capital num contrato de mútuo tem por objecto uma só prestação inicialmente estipulada. É exactamente isso que resulta do contrato de mútuo junto ao requerimento executivo: empréstimo na quantia de € 73.800,00.

24) Após a resolução do contrato de mútuo, deixam de poder ser exigidos juros remuneratórios e deixa de existir plano de pagamentos em prestações.

25) Com a resolução do contrato mútuo por incumprimento, deixam de existir quotas de amortização de capital pagáveis com juros.

26) O sentido literal da lei – e admitimos que o legislador se exprimiu de forma correta – foi de aplicar o prazo de prescrição às quotas de capital pagáveis com juros, isto é, enquanto existir um plano de reembolso.

27) Inexistindo plano, que foi destruído pelo vencimento antecipado, não é aceitável que o credor seja duplamente penalizado: para um efeito – o da cobrança, não existem juros remuneratórios; para outro – o da prescrição – já se admite a sua existência.

28) A melhor interpretação da lei, seja literal ou sistemática, é de que o prazo de prescrição de cinco anos previsto no art. 310º, al. e) do C. Civil só é aplicável enquanto o mútuo não estiver vencido.

29) Após o vencimento, os valores em divida voltam a assumir em pleno a sua natureza original de capital e de juros, ficando o capital sujeito ao prazo ordinário de 20 anos e os juros ao de cinco anos.

30) O devedor nunca será penalizado em mais de cinco anos de juros, pois estes, consabidamente, prescrevem em cinco anos nos termos do art. 310º, al. d) do C. Civil.

31) De acordo com a interpretação feita na douta sentença recorrida, não há uma mera proteção do devedor, mas sim um benefício claro, às custas do credor, tornando inexigíveis valores que aquele recebeu e de que se apropriou a título de capital.

32) A credora venceu a operação com venda de ½ do bem imóvel garantia na execução fiscal e após decorreram negociações com os devedores, nomeadamente, estudada a possibilidade de um financiamento para aquisição do bem pelos fiadores e consequente liquidação da dívida, não tendo havido inércia do credor quanto à tentativa de cobrança.

33) Verifica-se inconstitucionalidade da interpretação dada ao art. 310º, al. e) do C. Civil, por violação do direito à propriedade privada e, bem assim, dos princípios da confiança e da proporcionalidade ou da proibição do excesso (cfr. arts. 2º, 12º, nº 2, 18º, nºs 1, 2 e 3 e 62º, nº 1, todos da Constituição da República Portuguesa)

34) A interpretação dada à norma em crise é manifestamente desnecessária, inadequada e irracional. Desnecessária, porque, no confronto dos direitos de credor e devedor, este último já beneficia de um prazo de prescrição de juros de cinco anos, ao abrigo do art. 310º, al d) do C. Civil. Também o capital está sujeito ao prazo de prescrição ordinário de vinte anos, conforme resulta do art. 309º do C. Civil. Inadequada, pois tenta resolver diferentemente duas realidades idênticas: o mútuo gratuito, sem juros, e o mútuo antecipadamente vencido (em que também deixam de poder ser cobrados juros remuneratórios). Irracional, o que se traduz em excesso. De acordo com a interpretação feita na douta sentença recorrida, o interesse protegido – o direito do devedor a não ver a sua dívida acumulada desmesuradamente, que já se encontra garantido pela prescrição de juros – é substituído por um benefício excessivo, tornando inexigíveis valores que recebeu e de que se apropriou a título de capital, em prejuízo direto do credor.

35) A única forma adequada a contratos de crédito com a duração de várias décadas é, precisamente, considerar que o capital obedece ao prazo ordinário de prescrição de 20 anos.

36) De outra forma, a certeza e a segurança jurídica do crédito ficarão irremediavelmente abaladas, com isso se violando também o princípio constitucional da confiança consagrado no artº 2º da nossa Lei Fundamental.

Não foram apresentadas contra-alegações.

O recurso foi admitido, com subida nos próprios autos e efeito meramente devolutivo.

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Questões a resolver:

1 – Impugnação da decisão sobre a matéria de facto;

2 – Interrupção da prescrição;

3 – Prazo da prescrição;

4 – Constitucionalidade da interpretação do artigo 310.º, al. e), CC, feita na sentença recorrida.

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Na sentença recorrida, foram julgados provados os seguintes factos:

1. No dia 14.04.2020, a Caixa Geral de Depósitos, S.A. intentou acção executiva para pagamento de quantia certa, sob a forma de processo sumária, contra CCC, DDD, BBB e AAA, visando a cobrança coerciva da quantia de € 85.588,67, que correspondem ao capital e juros por liquidar do contrato de mútuo com hipoteca celebrado em 09.08.2004.

2. Tal contrato foi considerado resolvido, com vencimento integral da dívida, no dia 21.11.2012.

3. Entre 2015 e 2016 foram iniciadas conversações dos executados com a exequente no sentido de perceber se seria possível obter um financiamento para a aquisição da parte do imóvel sobre o qual incide a hipoteca, sem que os executados tenham concretizado qualquer proposta e/ou aquisição.

4. Os executados AAA e BBB foram citados no dia 14.08.2020.

5. Os presentes embargos deram entrada em 05.10.2020.

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1 – Impugnação da decisão sobre a matéria de facto:

A recorrente considera que o tribunal a quo cometeu um erro de julgamento no que concerne à matéria que consta do n.º 3 dos factos provados. No entendimento da recorrente, aquilo que ocorreu em 2015 e 2016 não se resumiu a meras conversações entre ela e os recorridos no sentido de perceber se seria viável um financiamento destinado à aquisição, pelos segundos, da parte do imóvel sobre o qual incide a hipoteca. A recorrente sustenta que resulta dos documentos juntos com a contestação e do depoimento da testemunha TTT que as referidas conversações visavam, em última instância, a extinção da dívida exequenda e a constituição de uma nova dívida, tendo os recorridos como devedores principais e adquirindo estes o imóvel sobre o qual incide a hipoteca. Ao tentarem, pela forma descrita, negociar a dívida exequenda, os recorridos teriam reconhecido a existência da mesma e a sua qualidade de fiadores.

Como resulta da exposição anterior, é pacífico que, em 2015 e 2016, ocorreram conversações entre os recorridos e a recorrente no sentido de a segunda conceder, aos primeiros, um financiamento destinado à aquisição do imóvel onerado com a hipoteca referida no n.º 1 dos factos provados. Ou seja, os fiadores quiseram comprar precisamente o imóvel cuja anterior compra originara a obrigação de pagamento do preço por eles garantida e, para esse efeito, mantiveram negociações com a credora. Considerando aquilo que é a normalidade da vida, fácil é concluir que a escolha do imóvel não foi fruto do acaso. Os recorrentes quiseram comprar aquele imóvel e não outro justamente porque a sua anterior compra gerara uma dívida por eles afiançada e que se encontrava numa situação de incumprimento. Por outras palavras, o projecto de compra daquele imóvel pelos recorridos visava a produção de efeitos ao nível das relações obrigacionais geradas pala compra anterior, encontrando-se uma solução para a referida situação de incumprimento, que os afectava enquanto fiadores. Não há outra explicação possível para a vontade dos recorridos de comprarem precisamente aquele imóvel e, para esse efeito, pretenderem um financiamento por parte da recorrente.

A prova indicada pela recorrente corrobora o que acabámos de afirmar.

Disse-o expressamente a testemunha TTT, segundo a qual, em 2016, os fiadores apresentaram-se numa agência da Caixa Geral de Depósitos da Madeira pretendendo obter um financiamento destinado a pagar a dívida garantida pela fiança, a qual se encontrava numa situação de incumprimento. Essa proposta dos fiadores passava pela aquisição, por eles, do imóvel em questão, sendo o preço pago através do referido financiamento. Porém, analisada a situação financeira dos fiadores, a Caixa Geral de Depósitos concluiu que a taxa de esforço era excessiva e, por essa razão, não concedeu o financiamento pretendido.

Este depoimento encontra corroboração em documentos juntos com a contestação.

Num mail remetido por um representante dos recorridos à recorrente em 03.03.2015, é indicado, como assunto, o contrato de mútuo referido no n.º 1 da matéria de facto provada. Aí se afirma, nomeadamente, que o remetente se encontra «informalmente mandatado pelos fiadores AAA e BBB para intervir no processo” e se solicita informação sobre o “andamento do processo relativo ao imóvel sito à Rua (…), n.º (…), (…), Freguesia de (…), em (…) – empréstimo n.º (…) – operação n.º PT (…)». Salienta-se, ainda, que «Sendo os fiadores a parte tendencialmente mais prejudicada no desfecho do processo, sentem-se igualmente apreensivos e agastados com a presente situação».

No mail enviado, em 07.09.2016, pela gerente da agência da recorrente no Caniço, EEE, a um outro departamento da mesma entidade, informa-se que a recorrida AAA entrou em contacto com aquela agência no sentido de se estudar a hipótese de financiamento da compra do imóvel dado em hipoteca para garantia do pagamento do empréstimo de que ela é fiadora e solicita-se que a gestora do processo informe “quais as hipóteses de alienação do imóvel à fiadora, e quais os montantes em cima da mesa”. 

No mail enviado, em 02.01.2017, pela recorrida AAA à gerente da agência da recorrente no Caniço, é indicado, como assunto, o empréstimo a que nos vimos referindo, e pergunta-se «se existe alguma novidade sobre o assunto em título».

A exposição a que procedemos demonstra que faltou, ao tribunal a quo, retirar a conclusão que se impunha: as conversações referidas no n.º 3 dos factos provados visavam solucionar a situação de incumprimento do contrato de mútuo referido no n.º 1. O financiamento da aquisição do imóvel constituía o meio para atingir aquele fim.

A recorrente tem, pois, razão ao pretender a alteração do n.º 3 da matéria de facto provada no sentido exposto. Consequentemente, o referido n.º 3 passa a ter a redacção proposta pela recorrente, que é a seguinte:

3) Entre 2015 e 2016, foram iniciadas conversações dos executados com a exequente no sentido de saber se seria possível obter um financiamento para a aquisição do imóvel sobre o qual incide a hipoteca, de forma a solucionar o montante do qual eram devedores.

2 – Interrupção da prescrição:

A recorrente sustenta que, ainda que o prazo de prescrição fosse de 5 anos, como o tribunal a quo decidiu, esta última não se teria verificado devido à ocorrência da causa de interrupção estabelecida no artigo 325.º CC. Segundo a recorrente, a tentativa de negociação encetada pelos recorridos traduziu-se no reconhecimento, por estes, do seu direito de crédito.

O n.º 1 do artigo 325.º CC estabelece que a prescrição é interrompida pelo reconhecimento do direito, efectuado perante o respectivo titular, por aquele contra quem o direito pode ser exercido. 

Recordemos que, atenta a alteração introduzida no n.º 3 da matéria de facto provada, o mesmo passou a ter a seguinte redacção: «Entre 2015 e 2016, foram iniciadas conversações dos executados com a exequente no sentido de saber se seria possível obter um financiamento para a aquisição do imóvel sobre o qual incide a hipoteca, de forma a solucionar o montante do qual eram devedores.»

Ora, quem negoceia a extinção de uma dívida com o seu credor, forçosamente reconhece a existência dessa mesma dívida perante este último, independentemente do resultado daquela negociação. Foi isso que aconteceu no caso dos autos. Os recorridos negociaram com a recorrente a obtenção de um financiamento para a aquisição do imóvel onerado com a hipoteca referida no n.º 1 da matéria de facto provada. Os recorridos ficariam, assim, adstritos a uma nova dívida para com a recorrente, comprando o imóvel em causa e extinguindo-se a fiança. Reconheceram, pois, a existência desta perante o credor.

Impõe-se, assim, concluir que, em 2015 e 2016, os recorridos reconheceram a existência do direito da recorrente, reconhecimento esse que interrompeu a prescrição nos termos do n.º 1 do artigo 325.º CC.

O vencimento integral da dívida ocorreu no dia 21.11.2012. Iniciou-se nessa data o prazo de prescrição das prestações então vencidas nos termos do artigo 781.º CC. Seja esse prazo de 5 ou de 20 anos, estava em curso em 2015 e foi interrompido nesse ano e, novamente no de 2016. Nos termos do artigo 326.º CC, ficou inutilizado o tempo até então decorrido e começou a contar novo prazo, idêntico ao anterior, na data em que ocorreu o último facto interruptivo. Os recorridos foram citados no dia 14.08.2020. Logo, ainda que o prazo de prescrição fosse de 5 anos, não se teria completado, devido às interrupções ocorridas em 2015 e 2016. O mesmo é dizer que o direito da recorrente não prescreveu, devendo a oposição à execução ser julgada improcedente, revogando-se a sentença recorrida.

Fica, assim, prejudicado o conhecimento das questões da duração do prazo de prescrição (5 ou 20 anos) e da constitucionalidade da interpretação do artigo 310.º, al. e), CC, feita na sentença recorrida. Repetimos, ainda que o prazo seja de 5 anos, a prescrição não ocorreu.

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Dispositivo:

Delibera-se, pelo exposto, julgar procedente o recurso e improcedente a oposição à execução, revogando-se a sentença recorrida.

Custas pelos recorridos.

Notifique.

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Évora, 24.02.2022

Vítor Sequinho dos Santos (relator)

1.º adjunto

2.ª adjunta


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